Práxis e o software livre
Felipe Forte
É triste ver um profundo desconhecimento disso na Esquerda brasileira e, pior, entre nossos camaradas, o uso de software proprietário é endêmico. Explico.
A explicação será mais orgânica para os marxistas: no contexto do materialismo dialético, o domínio do ideal não está isolado do domínio material. Nem o domínio material isolado do ideal. O hardware de uma máquina, ou seja, seus componentes, como placa-mãe, processador, memória, etc. faz parte do domínio material. O software, ou seja, os programas e aplicativos, o sistema operacional, os drivers, isso faria parte do domínio ideal. Nesse sentido, o código de um aplicativo é sempre ideológico, porque o desenvolvedor o programa do jeito que bem entende, a máquina só obedece. E se eu dissesse a vocês, camaradas, que a maioria dos aplicativos que usamos carregam uma profunda raiz neoliberal?
Dentro dos círculos de programação, fala-se de dois tipos de software: o software livre e o software proprietário [1]. O software proprietário é aquele que o código que compõe o aplicativo não é lançado para o público, ou seja, não podemos verificar o que o software faz com nossa máquina, se ele faz eficientemente, se ele faz algo que não deveria (como vigiar como você usa seu telefone), etc.. No caso do software livre, o código é aberto, ou seja, o público pode verificar o código de um aplicativo, e por isso, saber o que o código está fazendo com sua máquina, mas não só isso. O povo, com o conhecimento específico, pode modificar o código, lançar novas versões, estudar o código para aprender como funciona um aplicativo, etc.. Na terminologia, quando o software é livre, nós, o povo, somos donos dos meios de "produção". Por isso, ele é por definição gratuito, já que qualquer um tem acesso ao código. Mas não se engane, muitos softwares proprietários são vendidos (como o Windows), mas eles também podem ser gratuitos, como o WhatsApp, o Facebook (software proprietário como serviço), iOS, etc.. O Android, o sistema da maioria dos celulares do mundo, é código livre, mas os aplicativos da Google que vêm junto, não.
E qual é o benefício para os donos do software proprietário promover um aplicativo gratuito? Porque eles usam o fato de que você não tem acesso ao código para lucrar com outras coisas. Por exemplo, o Facebook usa seus dados para vender para você produtos, usando um algoritmo para analisar o que você publica, suas mensagens privadas, seus comentários nas publicações, suas fotos, as páginas que você curte, seus grupos, etc.. Nesse sentido, você não é cliente do serviço do Facebook. Você é o produto.
E aí, usando esse sistema, chega o oportunismo da burguesia de explorar isso para manipular você. Goebbels teria se apaixonado pelo Facebook! Que tal falar do caso da Cambridge Analytica, que usou os dados do Facebook de milhões de usuários para manipular as eleições da Austrália [2], Índia [3], Quênia [4], Malta [5], México [6], Reino Unido (com o Brexit) [7], e inclusive o próprio Estados Unidos com a eleição de Trump [8]? A empresa usava "métodos de ampliamento de dados e técnicas de segmentação de audiência" [9]. Segmentação de audiência... Dividir para conquistar? Eu reforço mais uma vez, nesse texto, a importância da gente não reproduzir o discurso de uma "esquerda cirandeira", "esquerda liberal" e afins, e já desenvolvi uma exposição sobre. [10][11]
Dito isso, NÃO USEM WHATSAPP!!! Usem o Telegram, pelo amor de Marx. O Telegram é código aberto, então todo o funcionamento do código já foi verificado por pesquisadores, técnicos, peritos e especialistas, e ele é extremamente confiável. O caso do "juiz" Moro não foi um problema do aplicativo Telegram, e sim do telefone do Moro [12]. O Telegram inclusive oferece de tempos em tempos um prêmio de US$300.000 para quem conseguir invadir o aplicativo [13]. Por que o tal hacker, então, não pediu seu prêmio? No caso do WhatsApp, praticamente todo ano, recebemos notícias de que foi invadido [14][15][16][17][18]. Até o celular do camarada Jones Manoel foi invadido no WhatsApp, mas pelo menos rendeu uma das publicações mais hilárias que eu já vi nos últimos meses [19].
É isto, por ora. Tenho muito mais a falar sobre, mas não queria inchar o texto.
Fiquem atentos!
[1] Free software is software that gives you, the user, the freedom to share, study and modify it. We call this free software because the user is free.
[2] Facebook says 310,000 Australian users may have been affected by Cambridge Analytica scandal
[3] 335 Indians installed a Cambridge Analytica app, exposing the Facebook data of 560,000
[4] “We’d stage the whole thing”: Cambridge Analytica was filmed boasting of its role in Kenya’s polls
[5] SCL influence in foreign elections
[6] Cambridge Analytica trabajó con el PRI: Channel 4 News
[7] Tory donors among investors in Cambridge Analytica parent firm
[8] Trump Campaign Turns to ‘Psychographic’ Data Firm Used by Cruz
[9] Cruz campaign paid $750,000 to ‘psychographic profiling’ company
[10] Resgatando o "dialético"
[11] Diálogo com o camarada Felipe Gonçalves nos comentários de uma publicação (link do facebook)
[12] Telegram, o caso Moro e você
[13] $300,000 for Cracking Telegram Encryption
[14] Why WhatsApp Will Never Be Secure
[15] WhatsApp users urged to update app immediately over spying fears
[16] WhatsApp Android And iOS Users Are Now At Risk From Malicious Video Files
[17] Everything you need to know about PRISM
[18] NSA taps data from 9 major Net firms
[19] Jones Manoel no Instagram (vale muito a pena a leitura kkkk)