Opinião - Jorge Abrahão: Diz-me como andas e eu te direi que cidade és

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O acesso aos serviços públicos, áreas de lazer e oportunidades de trabalho que as cidades oferecem é o que as tornam grandes polos de atração, uma tendência que vem incentivando a concentração de grande parte da população mundial. No Brasil, 85% das pessoas vivem nos centros urbanos.

A circulação pelas cidades torna-se então um desafio crescente e, em setembro, Mês da Mobilidade, vale uma reflexão sobre o panorama dos deslocamentos nos grandes centros urbanos. Para quem tem voltado aos espaços públicos com mais intensidade, especialmente nos grandes centros urbanos, é inevitável a percepção do aumento no número de pessoas e carros nas ruas.

As consequências não são apenas visuais, e para quem precisa atravessar São Paulo em seus trajetos cotidianos, os números são claros. A pesquisa Viver em São Paulo: Mobilidade Urbana, do Instituto Cidades Sustentáveis, em parceria com o Ipec, mostra que após três anos em queda, o tempo médio total de deslocamentos em 2022 subiu para 2h19 minutos na cidade. Entre moradores da Zona Leste pode passar das 3 horas.

Faltam, em São Paulo, políticas que garantam a segurança pública e viária aos pedestres e ciclistas - Adriano Vizoni - 20.set.22/Folhapress

O ônibus municipal segue como o transporte utilizado com maior frequência, responsável pelos deslocamentos de 33% da população na capital, enquanto quase metade dos paulistanos afirmam se deslocar a pé todos os dias, pelo menos em parte dos seus trajetos. Cabe à prefeitura criar e manter estruturas urbanas que promovam a mobilidade ativa e a livre circulação pelas cidades. As calçadas são precárias, estreitas, repletas de obstáculos e desníveis e sem sinalização adequada.

A pesquisa mostra ainda que recuou em 8% o percentual da população que afirma usar bicicleta, em relação a 2020, sendo que a metade dos usuários afirmam que furtos e roubos são as situações que mais afetam sua vontade de pedalar. Novamente, a desigualdade territorial: na Zona Leste da capital, caiu de 14% para 6% o percentual de ciclistas.

Faltam, em São Paulo, políticas públicas que garantam a segurança pública e viária aos pedestres e ciclistas. Ainda vivemos um predomínio da orientação do trânsito voltada aos motoristas. Basta notarmos que a maior parte da iluminação pública é destinada às ruas, e não às calçadas, além da ausência acachapante de sinalização voltada às bicicletas, tanto diretamente aos ciclistas, quanto aos motoristas de veículos motorizados. Tais sinalizações são importantes para evitar acidentes e para que se reconheça o papel de pedestres e ciclistas na cidade, demonstrando cuidado e estímulo ao convívio entre diferentes modais.

Diante das eleições gerais da próxima semana, chama atenção o pouco espaço do tema da mobilidade urbana nos programas de governo e na propaganda eleitoral como um todo. O governo federal e governos estaduais têm um desafio enorme de fortalecer os sistemas de transporte público, em um contexto de crise do financiamento do transporte e de menor número de passageiros transportados. É injusto deixar este papel somente com os municípios.

A criação de um Sistema Único de Mobilidade, similar ao SUS, onde haja uma redistribuição das competências sobre o transporte urbano, é uma das propostas da sociedade civil, campanha liderada pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) e pelo Instituto Movimento pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade (MDT), mas que já reúne mais de 140 organizações de todo o país. Participação cidadã efetiva, transparência de dados operacionais e econômicos, integração no planejamento em áreas metropolitanas e a adoção de tecnologias mais limpas são alguns dos princípios da proposição.

Neste próximo domingo, vale analisar como nossas cidades aparecem (ou não) nos programas das diferentes candidaturas. As diferentes esferas de governo têm enorme responsabilidade neste tema, que muito impacta a qualidade de vida de toda a população. É só pensar quantas coisas poderíamos fazer com as horas desperdiçadas nos deslocamentos de cada dia.

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