Como gamers ajudaram a sequenciar o DNA do intestino

Como gamers ajudaram a sequenciar o DNA do intestino

Lucas Zacari | 07 de junho de 2024(atualizado 07/06/2024 às 15h33)

Pesquisadores americanos e canadenses inseriram quebra-cabeça em jogo da franquia ‘Borderlands’. Resultado foi apresentado em estudo como exemplo de sucesso de ciência cidadã

Um estudo publicado em 15 de abril na revista científica Nature Biotechnology apresentou os resultados de uma atividade de ciência cidadã inserida em “Borderlands 3”. Pesquisadores de universidades canadenses e americanas incluíram um quebra-cabeça durante a história do videogame de 2019 para que os jogadores ajudassem a mapear o DNA e o RNA intestinal humano.

O minigame foi chamado de “Borderlands Science” e foi incorporado no jogo original em 7 de abril de 2020. Semelhante ao “Tetris” (1984), a tarefa consistia em alinhar sequências de blocos coloridos – cada cor representa um dos quatro nucleotídeos do DNA ou RNA (adenina, guanina, citosina e timina ou uracila) – e alcançar uma pontuação estipulada pelo game.

Aqueles que completassem o minigame recebiam como recompensa o dinheiro do jogo, utilizado para comprar roupas e acessórios no universo do game, e pontos para melhorar as habilidades dos personagens.

O desenvolvimento do minigame

Os quebra-cabeças foram criados a partir de amostras de fezes humanas coletadas pela The Microsseta Initiative, da Universidade de San Diego, dos EUA. 

O projeto coleta dados genômicos intestinais e analisa o microbioma para pesquisar, por exemplo, o impacto de doenças e dietas nas células.

A tarefa de decodificar as milhares de longas cadeias genéticas normalmente é feita por computadores, em pequenos pedaços. No entanto, muitos softwares têm dificuldade de identificar as sobreposições desses pedaços, comprometendo a análise. Isso poderia ser feito individualmente pelos cientistas, mas demandaria muito tempo.

Ao passar a decodificação para os jogadores, a identificação das sobreposições foi acelerada e o alinhamento das cadeias genéticas intestinais melhorou, de acordo com o estudo. Até maio de 2023, mais de 4 milhões de jogadores fizeram pelo menos um quebra-cabeça de “Borderlands Science”.

A relação com o jogo

A franquia “Borderlands” é do gênero de jogos de tiro em primeira pessoa e teve seu primeiro jogo lançado em 2009. A narrativa acompanha um grupo de exploradores no planeta selvagem Pandora. Os personagens procuram um local chamado Vault, um espaço mítico com armas e tecnologias de uma raça alienígena extinta, os Eridians.

Ao todo, a franquia conta com seis jogos que expandem o universo criado pela Gearbox Software, desenvolvedora do jogo. Uma adaptação em live action de “Borderlands” está prevista para ser lançada nos cinemas em agosto de 2024. No elenco, estão atores como Cate Blanchett, Kevin Hart, Jamie Lee Curtis e Jack Black.

“Borderlands 3”, por sua vez, mostra o grupo de caçadores se defendendo de uma seita que tenta tomar o poder da Vault. Para dar sentido dentro da história, os quebra-cabeças foram inseridos em uma máquina de fliperama presente no laboratório de um cientista. O vídeo abaixo mostra o local em que o arcade foi colocado e alguns dos minigames.

Games com ciência cidadã

Não é a primeira vez que cientistas utilizam jogos de videogames para criar iniciativas de ciência cidadã, pesquisas científicas com engajamento da população em geral.

Um dos primeiros foi “Foldit”, um jogo de computador de 2008 que pedia ajuda de pessoas para o enovelamento de proteínas – processo em que a estrutura se dobra para realizar a função biológica específica. O site da iniciativa relata que o projeto ajudou a tratar doenças como covid-19 e gripe e a criar medicamentos.

Uma tarefa de ciência cidadã foi incorporada no jogo “EVE Online” em 2003. O jogo de exploração espacial conta com uma iniciativa chamada “Project Discovery” desde 2015. Os jogadores recebem atividades lúdicas que têm relação com questões da vida real.

Durante a pandemia de covid-19, por exemplo, os jogadores foram submetidos a minigames em que precisavam desenhar polígonos ao redor de aglomerados de células humanas. Isso ajudava os cientistas a perceber a quantidade de proteínas na superfície celular, algo que muda de acordo com doenças ou com o uso de medicamentos.

A equipe que desenvolveu o minigame presente em “Borderlands 3” já tinha realizado uma experiência semelhante com “Phylo”. O jogo também tinha a intenção de identificar sequências genéticas, mas teve bem menos interação.

Em entrevista em abril para a Universidade McGill, do Canadá, Jerome Waldispühl, líder da pesquisa sobre o intestino, afirmou que os resultados obtidos em meio dia de “Borderlands Science” foram cinco vezes maiores que os coletados pelo jogo anterior.

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Link para matéria: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2024/06/07/dna-do-intestino-videogame-borderlands

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