A Boneca de Pano e a Princesinha

A Boneca de Pano e a Princesinha

LeviS


Era uma vez, em um reino distante, uma menina que se apaixonou perdidamente por um príncipe. E apesar de ela ser uma simples plebeia da floresta, tiveram um caso juntos às escondidas. E ela lhe disse, vamos fugir para longe. Nutro forte dentro de mim duas coisas: meu amor por ti, e uma criança tua. Tenho poderes, nada nos acontecerá. Fica comigo.

Mas o príncipe era de linhagem pura e já estava prometido à outra. E breve tempo depois tornou-se rei e casou-se em cerimônia real, rodeado de flores e vestido de pedras preciosas. Esqueceu-se da tal moça.

Sob o luar, ela apareceu vestida de capuz e cetim. Em segredo, disse à rainha, tome esta boneca, um humilde agrado para a filha do rei. A rainha aceitou o presente, mas o rei ficou furioso. Disse que não se deviam aceitar presentes de pleibeias, que eles já haviam os mais belos tecidos e os mais nobres cavalos. Mas a rainha lembrou de sua infância, quando também possuía os mais belos tecidos e os mais nobres cavalos, mas nenhuma boneca, por mais simples que fosse. E guardou a boneca, tão pequena, tão linda e tão singela, no fundo de um armário - para que ninguém na corte nunca soubesse dela!

E só quem sabia de sua existência era a princesinha, que a tinha como companhia inseparável - quando estavam às sós. Brincavam juntas, se encantavam juntas, e até cresciam juntas.

Até que um dia a princesa se encantou por um plebeu. Estava perdidamente apaixonada por ele... E o plebeu a temia, sabendo que ela era da realeza. Não queria saber dela, sempre abaixava sua cabeça em sua presença e por isso não reparava em sua beleza, não a olhava no olho e se encantava pelo seu olhar, sentia seu cheiro e se encantava por seu perfume.

A boneca, sentindo o lamento da menina, à chamou para dentro do armário. E lhe ofereceu uma troca. Dá-me teus olhos e fica com os meus. Assim ele irá reparar no teu lindo olhar, mais luminoso que a água que reflete a lua.

A princesa aceitou a troca, e olhou fundo nos olhos do plebeu. E quão replandecentes eles eram! A mais brilhante das estrelas ajoelharia-se diante daquela luz, tão magnífica.

Mas ainda não era suficiente.

A boneca, vendo as lágrimas da menina, à chamou para dentro do armário. E lhe propôs uma permuta. Dá-me o teu cheiro e fica com o meu. Assim ele irá reparar o quanto tu és doce, mais agradável que as tulipas que crescem felizes no campo.

A princesa aceitou a troca, e deixou que o plebeu a sentisse. E quão cheirosa ela estava! O plebeu ia se enfeitiçando aos poucos, tão maravilhoso era aquele cheiro, que derrotaria qualquer perfume feito de rosas carmesins.

Mas ainda não era suficiente...

A boneca, ouvindo o lamento da menina, à chamou para dentro do armário. E lhe sugeriu um câmbio. Dá-me tua pele e fica com a minha. Assim ele irá reparar no veludo da tua carne, mais macia que a superfície da lã aveludada com o descanso da paixão.

A princesa aceitou a troca, e deixou que o plebeu a tocasse. E quão formosa ela estava! O plebeu estava completamente perdido entre suas dobras, tão incrível era aquele tatear, superior à penugem dos pássaros, o pelo das ovelhas, o veludo das almofadas!

Faltava somente uma coisa. A princesa implorou que ele fosse dela, para todo o sempre.

Dá-me teu coração, que é de carne, e fica com o meu, que é de boneca.

E a princesa trocou completamente de lugar com a boneca. E sua aparência era de boneca, seus olhos eram de boneca, seu cheiro era de boneca, sua pele era de boneca e seu coração era de boneca... E não conseguia mais se mexer! E estava presa dentro do armário, esquecida, ninguém da corte sabia dela...

E a boneca, que tomou sua forma e seu lugar, partiu o coração do plebeu... como poderiam ficar juntos? Afinal, ela era nobre, nunca daria certo. Quer dizer, tinha aparência de nobre - olhos de princesa, cheiro de princesa, pele de princesa, coração de princesa.

Mas em seu corpo corria sangue de bruxa. Como sua mãe, que tinha poderes...

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