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O vitrô tremia com as pancadas, Maurílio levantou de chofre sem saber o que estava acontecendo, tentou esfregar os olhos e levantar da cama, mas foi surpreendido por mais três batidas no vidro. “Caralho” pensou ele pulando da cama e tropicando no tapetinho, tentando abrir as cortinas para dar um belo xingão no filho da puta que o estava incomodando em pleno sábado, 6:30 da manhã.

Na primeira fresta aberta pode ver uma figura corpulenta encostada no vidro, o homem do lado de fora percebeu a movimentação e se virou com um sorriso enorme por baixo do bigode bem cuidado. Maurílio não conseguia acreditar naquela cena, conseguia ver seu reflexo nos óculos espelhados de Julinho.

-Vamo, neném. – O piloto começou a rir vendo Maurílio com cara de poucos amigos e pijaminha amassado, por alguns pouquíssimos segundos só se escutava o motor velho do ventilador no chão do quarto. Abriu mais o sorriso ao ver aquela carinha brava e deu mais algumas batidinhas no vidro. - Ta faltando só você, até pulei o portão pra te chamar. Tá faltando você, o carvão, as linguiça que Renan esqueceu e mais meu calção de banho. Mas cê tá na lista, dodói!

- Vai a merda, Julinho. – Maurílio respondeu fechando a cortina e se jogando na cama novamente, enrolando o rosto com um lençol e terminando com um travesseiro em cima, como se isso fosse impedir que a barulheira na janela não fosse ouvida. Julinho tinha ido noite passada com os amigos para um sitio que Rogerinho tinha arrumado pra um fim de semana de folga, pelos comentários o lugar tinha uma bela piscina e uma baita churrasqueira. Ninguém sabia como o piloto tinha arrumado o lugar e no fundo ninguém queria saber, porque era bem provável que os donos do local nem soubessem que teriam hóspedes no fim de semana.

Maurílio acabou não indo por ter arranjado uns passageiros a mais na sexta-feira, um bando de figurantes de uma cena noturna no PROJAC e alguns senhores que ele não sabia nem de onde eram. O trabalho ia ocupar grande parte da noite, não conseguiria acompanhar os amigos a tempo. No fundo, nem queria ir, pois sabia que Julinho levaria junto a nova peguete e teria 0% de paciência pra lidar com as cenas de paixão do machão convencido e galanteador. O que Julinho estava fazendo ali naquela hora da manhã, Maurílio nem queria ouvir.

- Vou embora não, paixão. –Disse esperando alguma resposta, só silêncio.- Vô cantar um samba pra tu então, se liga nessa. – Julinho se encostou de novo na janela e pegou um cigarro no bolso, tossiu algumas vezes e começou em voz alta, buscando incomodar de verdade o rapaz. – TE GANHEI NO PAPARICO, TE PAPARIQUEEEI. QUIS TE DAR UM FINO TRATO E ME APAIX...

Nem conseguiu terminar a sentença, pois foi interrompido pelo barulho alto da janela abrindo violentamente. Julinho bateu algumas palmas, feliz por ter vencido o jogo. – BORA, PALESTRA. – Bradou o do bigode tentando subir a janela.

-Eu não vou, Julinho. – Respondeu Maurílio em tom calmo e decidido, sentado na cama com os braços cruzados, observando Julinho invadir seu quarto. – Só abri a janela pra que você parasse com todo esse escândalo.

-Vai te toma no cu, rapá. – Disse Julinho abrindo o guarda-roupa e tirando as roupas do lugar. Maurílio tentou impedir, mas o rapaz já tinha bagunçado metade da organização perfeita e extremamente planejada. – Vai catar uma mochila ou vai ficar ai parado? Não tenho filho marmanjo não. To fazendo isso aqui só porque cê não se mexe. – Terminou jogando uma camisa florida na direção de Maurílio.

O Palestrinha conseguiu segurar a peça de roupa antes que ela caísse no chão e dobrou com cuidado a colocando em cima da cama, segundos depois foi atingido na nuca por um calção todo amassado. – Julinho, eu não tenho mochila... na verdade tenho, mas Amanda viajou com umas amigas e acabou pegando emprestado. Meu Deus, para de mexer nas minhas coisas. – Pediu Maurílio com uma mão parada na cintura ao ver o piloto segurando uma cueca boxer e rindo enquanto soltava um “olha só que ele já é hominho”.

-Dodói, tem desculpa pra me arranjar não. – Disse jogando a cueca por cima da cabeça do rapaz irritado pra tentar atingir a cama. Sucesso! – Não tem mochila vai na sacola mesmo, cê não vai fugir não. Não quer carregar pesinho? Papai carrega pra você, dodói – Terminou com algumas batidinhas no queixo do Palestra. - Se você não for, que graça que vai ter pra mim?

Ao terminar a frase, Julinho percebeu que talvez tivesse falado demais. Coçou o bigode ao ver Maurílio parado de olhos bem abertos, como se tivesse tomado uma xicara de café muito forte. Não via graça nenhuma em uma viagem sem Maurílio, queria leva-lo e vê-lo feliz em um fim de semana num lugar bacana, a garganta apertou um pouquinho e as ideias meio perdidas. Alguns segundos depois continuou a falar, sem querer assumir que sentia a falta do moreno. - Quem que eu vou zoar lá? Não tem graça zoar Renan, se zoar Cerginho o Rogerinho briga. Só sobra você.

O fiozinho de esperança que tinha percorrido a espinha de Maurílio quase sumiu, era bom demais pra ser verdade Julinho sentir sua falta de forma além da forma tradicional de zoeiras e encheções de saco, mas a confusão do outro e a demora em continuar a frase fez uma ou outra borboleta permanecer viva em seu estômago. Um pouco mais calmo, mas vendo que sua vontade de ficar em casa não seria levada em conta, empurrou Julinho para o lado, levantou um pouco o colchão e tirou debaixo uma sacola amarrotada da Renner. Envergonhado, tirou da sacola uma bolsa estilo carteiro, e antes que Julinho começasse a zoar levantou um olhar irritado. Nunca tinha usado, viu um pessoal no PROJAC com algumas dessas e quis parecer um pouco mais “cineasta”. O do bigode levantou as mãos, entendeu o recado, se zoasse Maurílio desistiria e expulsaria ele da casa. – Não demora pra se arrumar não, dodói. Cê já é lindo, vê se não embaça. – Disse com um sorriso malandro, subindo na janela pra ir pra fora. Maurílio tentou conter um sorriso apertando uma camisa contra o peito.

-Sabia que nessa casa tem portas, Julinho? – Disse em voz alta para provocar, colocando as roupas na bolsa um tanto quanto alegre.

-Se arruma, porra. – Bradou Julinho indo em direção a Sprinter.

 

 

 

  

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