Com filhos já criados, mulheres 50+ vão atrás do diploma superior

Com filhos já criados, mulheres 50+ vão atrás do diploma superior

www1.folha.uol.com.br

Impossibilitadas de estudar durante a juventude e a maternidade, mulheres com mais de 50 anos têm ingressado na universidade depois de seus filhos se tornarem adultos e, em alguns casos, se formarem no ensino superior. Com as demandas reduzidas, elas decidem viver a própria graduação.

"Com as reservas de vagas para alunos de baixa renda ou de escola pública, essas pessoas passam a ter condições de ingressar na universidade", diz Graziele Aline Zonta, doutora em psicologia pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Ela estudou a vivência universitária de estudantes com mais de 40 anos.

Nadilene Maria da Silva, 54, na UFRJ, onde cursa serviço social desde 2021, depois que seus filhos mais velhos já eram independentes e ela tinha apenas os gêmeos, hoje com 7 anos, para cuidar. - Zo Guimarães/Folhapress

Agente de inclusão em uma escola infantil e estudante de serviço social pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Nadilene Maria da Silva, 54, sempre gostou de estudar, mas aos 13 anos foi trabalhar como empregada doméstica e a escola se tornou um plano fora de cogitação.

"Pelo que eu estudo hoje em dia, tenho consciência de que o que vivi foi trabalho análogo à escravidão. Fui enviada para uma casa de família onde eu não podia estudar e só saia uma vez por por mês, para ir em casa", afirma.

Aos 17, ela engravidou de seu primeiro filho e pouco tempo depois ficou viúva. Com outro companheiro teve uma menina e mais um menino. Eles têm hoje 36, 34 e 32 anos, respectivamente. Em outro relacionamento, teve um casal de gêmeos, hoje com 7 anos.

"A prioridade eram eles e os estudos deles. Quando cresceram, cada um conquistou sua casa, casou. Hoje todos têm uma profissão, e eu sinto orgulho disso. Então falei: ‘Agora é minha vez’", diz.

Embora decidida, Nadilene precisou negociar com o pai dos mais novos o cuidado das crianças enquanto estuda. A aprovação no curso também não foi fácil. Cobradora de ônibus e com pouco tempo para se preparar, ela prestou o Enem três vezes sem bons resultados, até ser aprovada na quarta tentativa.

Josilene Nascimento Silva, 59, que se formou em psicologia em 2022 e só ingressou na faculdade depois que filha já cursava em Artes Cênicas pela USP - Lucas Seixas/Folhapress

Graziele conta que, na maioria dos casos, estudar com colegas muito mais jovens gera desafios.

Segundo ela, no contexto de um trabalho acadêmico, por exemplo, estudantes mais velhos tendem a preferir se encontrar pessoalmente para as discussões e a pesquisar por meio dos livros da biblioteca. Já os mais jovens costumam preferir se comunicar por mensagem e pesquisar online.

Tais desencontros podem levar a preconceitos como o etarismo. "Eu ouço muito: 'Para que velha fazendo faculdade?'", conta Nadilene.

"No primeiro período, sofri rejeição pela minha idade. Depois fui quebrando esse preconceito com o meu trabalho, meu esforço e minha dedicação em sala de aula."

Já Josilene Nascimento Silva, 59, que se formou no curso de psicologia em 2022, diz não ter enfrentado preconceito dos alunos mais jovens. Os que a excluíam tinham entre 30 e 40 anos de idade.

"Até com pessoas que tinham diferença de um ano para minha idade, eu sentia uma certa dificuldade na hora de fazer grupo. Já as meninas mais novas me convidavam e tenho amizade até hoje, quando o meu maior medo era que não me aceitassem."

Ela sonhava em trabalhar na área de saúde desde a infância e, em 2018, entrou na Faculdade Anhanguera, em São Paulo. Durante a juventude, a necessidade de ajudar os pais com as contas da casa foi a prioridade. Depois foi a vez dos cuidados com sua filha e sua mãe, que perdeu a visão nos últimos anos de vida.

"Depois que ela faleceu, começou a brotar novamente a ideia da faculdade, e eu queria voltar com tudo, porque a idade estava chegando e eu não ia conseguir atuar para sempre na área em que estava", diz. Josilene trabalhava com prevenção a fraudes em um banco e sentia que a profissão tendia a ser ocupada por pessoas mais jovens.

Nessa época, sua única filha estava na faculdade havia dois anos. Foi ela quem deu à mãe dicas sobre a redação do Enem e como realizar a prova.

Para Graziele, as políticas públicas que contribuíram para o acesso dessas mães à faculdade devem ser acompanhadas por iniciativas de inclusão ao longo do curso.

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